Archive for the ‘Secos & Molhados’ category

Top 30 – 1970/1979 (6ª parte ou Sessão Nostalgia)

12/07/2013
Crime of the Century (1974), Supertramp.

Crime of the Century (1974), Supertramp.

A carreira do Supertramp se construiu em torno da combinação criativa da dupla Roger Hodgson e Rick Davies, desde sua estréia em 1970, com um (bom) disco genuinamente progressivo. Entretanto, o álbum com capa tosca não impressionou. Acompanhados de outros músicos, fizeram nova tentativa no ano seguinte, incorporando agora o blues e um pouco de folk na sonoridade da banda. Apesar da famosa capa da mulher tatuada com os peitos de fora, voltou a não empolgar. Com sua terceira banda (dessa vez a definitiva), partiram para o terceiro disco, lançado três anos depois.

Em Crime of the Century, a banda atingiu o equilíbrio perfeito entre a origem progressiva, o blues de Davies e o recém incorporado pop de Hodgson. Perfeito da primeira à última faixa, os dois fracassos anteriores cobram seu preço na produção. A diferença sonora em relação aos álbuns posteriores é bastante perceptível, o que não impede de ser este o melhor momento do Supertramp em estúdio. Afinal, lá estão School, Rudy, Dreamer, Hide in your Shell, Asylum

Feita esta constatação, não deixo de rir ao me lembrar do longo tempo em que o vinil de Crime of the Century era um objeto inalcançável lá em casa. Enquanto as bolachas de Even in the Quietest Moments e Breakfast in America eram tocados até arranhar por mim e por minha irmã, Crime of the Century integrava a “coleção de ouro” do meu irmão: os discos que só ele podia tocar, manipular, e escutava exclusivamente no toca-discos artesanal especial do meu pai. Por sorte, o duplo ao vivo Paris (que eu comprei) continha quase todas as faixas do álbum, ficando de fora apenas If everyone was listening (no final das contas, a mais fraca).

Enfim, não poderia falar do álbum sem comentar a capa, a minha preferida da banda e uma das melhores em geral. Aliás, ela me faz lembrar a Zona Fantasma naqueles filmes de Superman com o Christopher Reeve. Afinal, tratava-se de uma prisão a girar solta pelo espaço.

Rudy ao vivo em 2010.

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Secos & Molhados (1973).

Secos & Molhados (1973).

Desde que me entendo por gente havia aquele disco do Secos & Molhados lá em casa. Não preciso dizer a fascinação que provocava em uma criança aquelas cabeças pintadas servidas numa bandeja. Pra não falar naquela famosa pegadinha: “você acredita que não é uma mulher que está cantando?” (uma década depois a história voltaria a se repetir com Mick Hucknall, do Simply Red – não só não era uma mulher, como não era uma negona).

Na época, minha música preferida era O Vira, enquanto Rosa de Hiroshima não suportava ouvir. Afinal, de gato preto, lobisomem, coruja, saci e de fadas criança entende. Já aquela história de crianças mudas e meninas cegas era muito esquisita… De qualquer forma, não demorou muito pro disco ficar mais arranhado do que eu em tombo de bicicleta.

Creio que só fui revisitar Secos & Molhados na época da faculdade, ouvindo amigos ensaiando Sangue Latino. Mesmo tendo passado tanto tempo, aqueles acordes estavam entranhados na veia como um “atirei o pau no gato”. Eu conhecia a música sem mesmo reconhecê-la. Mas só quando o CD foi lançado é que pude mergulhar novamente naquele oceano criativo.

É difícil crer que um disco desses surgiu no Brasil em 1973, em pleno governo Médici, com toda a exuberância de um jovem Ney Matogrosso e algumas letras incômodas, lotando o Maracanãzinho, então maior palco de shows no Rio de Janeiro. Mas o mais incrível mesmo é constatar o brilhantismo dos arranjos, das composições, um sentimento de “caramba, a gente fazia isso no Brasil?!!” que só fui ter ouvindo Mutantes.

Um hilário playback de Sangue Latino na TV (me lembrou muito a história em que Cebolinha e Cascão montam um grupo de rock).

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The Dark Side of the Moon (1973), Pink Floyd.

The Dark Side of the Moon (1973), Pink Floyd.

Seguindo pelas reminiscências da infância, The Dark Side of the Moon era aquele disco que todos os jovens escutavam… uma, duas, várias vezes. Eu não era jovem, era criança, mas ficava intrigado com aquela capa do prisma. Acho que todo mundo na época devia querer ter uma pirâmide de cristal ou algo parecido para tentar reproduzir o efeito. Creio que a gente tinha um peso de papel em forma de cubo… Não lembro se funcionou.

Minha lembrança concreta mais antiga é de esticar o pescoço pela janela (na velha casa da Aldeia onde meu tio morava) pra dentro do quarto da minha prima Denise e ver o pessoal sentado na cama, no chão, olhando perdido pro papel de parede, pro teto, enquanto ouvia o disco.

Eventualmente esse vinil chegou lá em casa, muitos anos depois. O mais vendido, o mais festejado, o mais tocado, mas não era o meu favorito do Pink Floyd. Wish You Were Here me encantava muito mais. Tenho implicância com a instrumental On the run, que sempre me soou (e ainda soa) como uma encheção de lingüiça entre Breathe e Time. Money e Us and Them me pareciam arrastadas demais, mas só fui me dar conta que o problema era esse quando lançaram o Delicate Sound of Thunder, no qual Money tinha o groove que vinha da minha cabeça, mas não da caixa de som. Ao contrário da sua contraparte do lado A, Any colour you like é um bom instrumental, que só irrita nas divisões de faixa ou arquivos digitais (um problema inexistente na era analógica). A sequência final com Brain Damage e Eclipse era o que realmente redimia o lado B.

No lado A, claro, a sequência de Time, Breathe (reprise) e The Great Gig in the Sky garante ao álbum o seu merecido lugar na história. Só Time já seria capaz de carregar todo um disco nas costas, uma das mais belas letras de todos os tempos. O vocal de Clare Torry em The Great Gig in the Sky vem arrepiando gerações. Há tempos eu tenho a curiosidade de ouvi-la com um saxofone no lugar da voz. Tenho certeza de que alguém já pensou nisso e já pôs a ideia em prática, só não chegou aos meus ouvidos ainda.

Todo mundo reunido no Live 8 tocando Money.

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Ashes are Burning (1973), Renaissance.

Ashes are Burning (1973), Renaissance.

Por muito tempo, Ashes are Burning foi, pra mim, sinônimo de Renaissance (os outros discos, importados, faziam parte da “coleção proibida” do meu irmão). Foi amor a primeira audição. Afinal, já não era tão criança e canções como Carpet of the Sun e Can you understand? me pegavam de jeito, do tipo que grudam mesmo.

Meu irmão era apaixonado por Let it grow, e ficou espumando de raiva quando a canção começou a tocar nas rádios. Seu temor era ser visto como alguém que gostava da música porque ela tocava nas rádios, por modismo, como se estivessem roubando-lhe a identidade.

A faixa-título é sensacional, mas só fui apreciá-la devidamente mais tarde, depois de me desacostumar da longuíssima versão ao vivo (e o incrível solo de baixo de Jon Camp) do Live at Carnegie Hall. Por, a minha versão em CD veio com a abertura e encerramento de La Cathédrale Engloutie de Debussy na belíssima At the Harbour. On the Frontier resta como a mais mediana do álbum.

Tanto o antecessor, Prologue, como o disco seguinte, Turn of the Cards, são muito bons. Mas só Scheherazade and Other Stories rivaliza com Ashes are Burning, saindo fora desse Top 30 na reta final. Esses quatro discos em sequência formam uma discografia de qualidade incomum. Infelizmente, o desprestígio do rock progressivo ao longo dos anos fez com que o Renaissance caísse um pouco no esquecimento.

Hoje tendo a concordar com as críticas aos agudos de Annie Haslam (não que isso me impeça de continuar gostando da banda), mas na época aquilo era o suprassumo.

Carpet of the Sun ao vivo em 1977.